Artigo: O colapso no sistema penitenciário de Minas Gerais

Por Cristiano Silveira*
Nos primeiros 50 dias de 2015, o Ministério Público de Minas Gerais foi à Justiça para obter a interdição de cinco grandes presídios da Região Metropolitana de Belo Horizonte. A iniciativa implica proibir a Secretaria de Estado de Defesa Social, responsável pelo sistema por meio da Subsecretaria de Administração Prisional (Suapi), de receber novos presos nessas instalações. No caso da Penitenciária José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, a medida judicial foi além. Determinou a retirada de 1.400 detentos excedentes em relação à capacidade do presídio. Essas restrições somam-se ao estabelecimento pela Justiça, também a pedido do MPMG, de um teto de lotação na maior unidade prisional do Estado, a Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem.
O argumento do Ministério Público é claro e tem fundo humanitário: a superlotação ameaça a segurança dos servidores públicos que labutam nesses presídios e ofende a dignidade dos detentos. A primeira consequência das interdições, contudo, foi solapar a capacidade do Estado de administrar com um mínimo de eficácia um sistema marcado por um grave deficit de vagas que perdura há vários anos. Antes de completar 60 dias e às vésperas do Carnaval, o governo Fernando Pimentel, herdeiro desse descalabro, não tinha onde colocar pessoas presas em flagrante delito na Região Metropolitana. No interior, a situação não é muito melhor. Neste começo de ano, interdições para recebimento de novos presos pedidas pelo MPMG atingiram várias unidades da Suapi, como o Presídio Regional de Montes Claros.
Em 31 de dezembro de 2014, último dia do governo anterior, a situação do sistema era a seguinte: população carcerária de 65.330 presos, 30.349 detentos provisórios aguardando condenação pela Justiça e deficit de 25.028 vagas (38%). A única possibilidade apresentada pelo MPMG para suspender as interdições nos presídios da Região Metropolitana é a inauguração das duas últimas unidades da Parceria Público Privada (PPP), em Ribeirão das Neves. Certamente os promotores de Justiça sabem que as três primeiras unidades da PPP foram entregues com dois anos de atraso em relação ao cronograma original e que as demais, com construção também a cargo do parceiro privado, já estão atrasadas em quatro anos. Já o programa público estadual de expansão prometido pelos governos anteriores foi marcado pela paralisação de quatro obras em novembro de 2014, atrasando a abertura de 1.100 vagas em 04 presídios. E nem sequer começou a anunciada construção de outras oito unidades, com aproximadamente 4,5 mil vagas.
Diante da grave situação financeira que o atual governo de Minas herdou, buscar a solução para a criminalidade exclusivamente na expansão do sistema prisional é uma atitude pouco realista. Demora e custa caro. Nos primeiros 35 dias de 2015 registrou-se um aumento de 1.885 presos no sistema estadual, o que representou uma média de 53 detentos adicionais por dia. A fatura que resulta dessa dinâmica é salgada. A título de exemplo, um dos novos presídios projetados para o Estado, no município de Pará de Minas, com 407 vagas, custará cerca de R$ 16 milhões.
O Ministério Público e o Judiciário podem dar uma importante contribuição na busca de outras soluções para a superlotação dos presídios, especialmente no que se refere aos presos provisórios. Em 2014, foram feitas 106.859 prisões em Minas, sendo 90% em caráter provisório. Já as prisões decorrentes de condenação pela Justiça não chegaram a 5% do total. No mínimo, essa desproporção permite sugerir que boa parte dos presos provisórios poderiam estar em liberdade ou cumprindo medidas alternativas.
*Cristiano Silveira é deputado estadual pelo PT na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), onde preside a Comissão de Direitos Humanos. Foi vereador e vice-prefeito de São João del-Rei. Foi consultor da Unesco no monitoramento das ações de prevenção e enfrentamento à criminalidade em Minas por meio do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) do Ministério da Justiça.