Impasse deixa moradores de ocupações da Grande BH em risco de despejo

Moradores de ocupações da Região Metropolitana de Belo Horizonte correm o risco de serem despejados por conta de um impasse entre eles, o Poder Público e a iniciativa privada. Sem um acordo para regularização dos terrenos e imóveis, o caso pode ser decidido na Justiça, o que pode resultar em ordens de despejo. Este cenário preocupa a Comissão de Direitos Humanos da ALMG, que realizou uma audiência pública, na quarta-feira (6), para discutir o assunto.
A situação mais preocupante é das ocupações Rosa Leão, Vitória e Esperança, localizadas na região do Isidoro, no Vetor Norte da capital. No local, vivem mais de oito mil famílias. O projeto da administração municipal é que o terreno receba a construção de unidades do programa habitacional popular Minha Casa, Minha Vida. Por conta disso, a Prefeitura entrou com um pedido de reintegração de posse.
A Direcional Engenharia propôs que os moradores das ocupações Rosa Leão e Esperança fossem remanejados para o espaço da ocupação Vitória, que pertence ao município de Santa Luzia. A mudança colocaria as famílias em uma área que está fora da disputa judicial, o que evitaria as ações de despejo. Dessa forma, a construtora teria condições de iniciar as obras dos apartamentos nos terrenos que fossem desocupados. A proposta da empreiteira não agrada aos moradores, que querem a regularização das casas já construídas.
Resistência
“Os moradores das ocupações são trabalhadores, assalariados, que construíram essa cidade. Nós lutamos pelo direito à moradia digna. A fila de espera do programa Minha Casa, Minha Vida é enorme e demorada. Queremos ficar nas nossas casas. Precisamos de uma solução. Estamos sendo recusados em postos de saúde por não termos um endereço legalizado”, relatou Charlene Cristiane, representante da ocupação Rosa Leão.
Edna Gonçalves, da ocupação Esperança, disse que os moradores não cumprirão ordens de despejo. “Construímos nossas casas com nosso próprio suor. Trabalhamos, temos hortas, criamos nossos filhos nesse local. Não aceitaremos que nossos lares sejam derrubados”.
“Queremos a garantia de que haverá negociação. Queremos ser ouvidos para fazermos uma contraproposta. As ocupações não são um problema para a cidade. Elas são a solução para o déficit de moradias populares que enfrentamos na Grande BH. Não vamos aceitar o despejo”, disse o vereador da capital, Adriano Ventura.
A representante da ocupação Vitória, Eliane Veloso, reclamou da postura da Companhia de Habitação do Estado de Minas Gerais (Cohab). “Estão querendo empurrar essa proposta a força para cima de nós. Não há negociação, não há debate. A Cohab está fazendo chacota com a nossa cara”.
Confira as imagens da audiência
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(Fotos: Jean Piter)
Insatisfação
O coordenador do Movimento Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLV), também questionou a falta de diálogo. “Ou aceitamos a proposta da Cohab ou somos despejados. Isso é um absurdo. É muito fácil um juiz que ganha R$ 30 mil por mês julgar nossa situação. Eles não sabem as dificuldades que passamos nas ocupações. Não vamos aceitar as ordens de despejo”.
A coordenadora das Brigadas Populares, Isabela Miranda, lamentou a ausência de representantes da Prefeitura de Belo Horizonte. “São mais de 150 mil famílias em ocupações na Grande BH. São ocupações organizadas, temos ruas com seis metros de largura. Estamos fazendo o que as prefeituras não fazem. Elas deixam de lado o estatuto das cidades quando não nos fornecem os serviços básicos. E é uma pena que o prefeito de BH, Marcio Lacerda, boicote todos os espaços de diálogo”.
Isabela Miranda também destacou que os moradores não são contra o Minha Casa, Minha Vida. “O problema é que o programa não atende às nossas necessidades. O que queremos é que o programa melhore. Um apartamento de 44 metros é muito pequeno para quem tem família”.
Poder Judiciário
Afonso Henrique de Miranda, procurador de Justiça do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), cobrou ações do Poder Judiciário. “O Tribunal de Justiça de Minas (TJMG) precisa de um juizado especial para as questões das ocupações. É preciso que o magistrado leve em conta a complexidade do tema nesses casos de reintegração de posse”.
Propostas
O presidente da Cohab MG, Claudius Vinicius Leite Pereira, disse que as negociações não estão avançando. “Há uma proposta para que as famílias desocupem parcialmente o terreno do Isidoro. Outra medida seria a alocação dessas pessoas no programa Minhas Casa, Minha Vida. Entretanto, elas não querem moradias verticais, não querem apartamentos. Sendo assim, até o momento, não há acordo entre os moradores e a construtora”.
Serviços básicos
O presidente da Comissão de Direitos Humanos da ALMG, deputado Cristiano Silveira, defendeu que as negociações precisam continuar. “É preciso que haja um entendimento entre as partes para evitarmos as ações de despejo. Os moradores já disseram que não vão deixar suas casas. Tememos que seja preciso uso da força, por parte da Polícia Militar, no cumprimento de as ações de reintegração de posse. Isso poderá resultar em conflitos em locais que moram muitas mulheres, crianças e idosos. Não queremos que isso ocorra. Precisamos manter a mesa negociações para chegarmos a um acordo”.
Ao fim da reunião, os parlamentares aprovaram requerimento para que sejam enviados pedidos de providências às prefeituras de Belo Horizonte, Contagem, Nova Lima, Rio Acima, Ribeirão das Neves, Ibirité e Vespasiano. Será solicitado que as administrações municipais forneçam os serviços básicos aos moradores das ocupações, como acesso à saúde e educação.
Visita
Cristiano Silveira propôs que os parlamentares façam uma visita conjunta às ocupações da Região Metropolitana. Serão convidados os deputados das comissões de Direitos Humanos, Assuntos Municipais, e de Participação Popular. A data deverá ser marcada nos próximos dias.